segunda-feira, 14 de julho de 2008



Mary Jô Orfanidis fez como Colombo quando botou o ovo em pé. Inverteu as expectativas e levou o conjunto de uma de sua obras: Arquétipos - “O Giro das Deusas”, em uma mostra itinerante, até algumas das escolas públicas do Distrito Federal.
É uma virada interessante, essa de levar arte aos estudantes e professores, dialogar com eles, apresentar seus motivos, as técnicas e os materiais utilizados no processo de produção, os significados que o autor atribui aos seus objetos de criação. E vê-los reagir, ouvir-lhes a expressão, muitas vezes surpreendente, dos sentidos captados, da reconstrução subjetiva dos mesmos objetos.
Trata-se de um contato vivo e muito mais completo do que usualmente as galerias de arte permitem, tão distantes dos endereços escolares, tão sofisticadas em suas instalações, até para induzir a comercialização mediante o deslumbramento...
A mostra itinerante instala-se em uma das salas de aula e os trabalhos expõem o seu valor intrínseco à avaliação de um público interessado, não só porque há uma quebra de rotinas, mas porque se pode interagir com o autor e perceber a arte e o artista como uma possibilidade inerente ao ser humano interessado em assim fazer-se no seu quotidiano.
Dificilmente se pensaria uma experiência mais educativa que um contato como esse, cujos resultados podem ser maximizados mediante exploração didática. Pode haver uma preparação prévia do evento. Pode-se desdobrar as suas conseqüências nas atividades curriculares.
Eu acompanhei a mostra itinerante em duas escolas, uma urbana e uma rural. E dessa vivência tirei o depoimento que ora expresso. Seria muito bom para a educação e para os artistas que a arte se aproximasse às escolas.
Aloilson Pinto
Professor





“Olá, bom dia, sejam bem vindos à Galeria Escolar, meu nome é Mary Jô Orfanidis, sou artista plástica de Brasília e vim trazer para vocês a minha exposição - Arquétipos - O Giro das deusas...”
Este é o meu primeiro contato com os alunos, com idades entre 5 e 20 anos. Ao adentrarem a Galeria Escolar, o primeiro impacto, admiração por estarem em um ambiente com obras de arte nas paredes, ou seja, a Galeria. Talvez boa parte dos alunos desconheça uma Galeria. As professoras/coordenadora do lado de fora orientam os alunos para não tocar nas obras e para fazer silêncio para ouvir a explicação da artista. O antes é todo planejado. Alexandre, meu esposo, recebe-os na porta, indica a direção e tira fotos (os alunos adoram); Patrícia, minha assistente, coordena a entrada e saída dos alunos dentro da Galeria. Ela cronometra o tempo de 12 a 15 minutos e as vezes 7 minutos. Alguns alunos, ao responder o questionário, expressam o desejo de poder ficar um pouco mais, o que não é possível, pois são muitas as turmas a serem atendidas, algumas são tão grandes que eu tenho que dividi-las em duas de 20 a 22 alunos devido a estatura deles. Já a turma de crianças com 35 alunos de 5 e 6 anos pode entrar, pois são menores. O objetivo é que todos possam ver a exposição. A visita é guiada, começo com a deusa Hera e termino na mesa montada com livros, computador e objetos diversos, que simbolizam todo o processo criativo.

Movimentos...










A movimentação começa cedo, às 6:00 hs em minha casa. Descemos com as obras e os materiais. Lá embaixo, a turma que acompanhará em carreata a exposição em direção à escola agendada está aguardando.
Floriano filma os primeiros passos do “grande dia”. Para os alunos, cuja oportunidade é única, a experiência é inexplicável; para alguns, o dia será único “uma frieza inexplicada”, “ um friozinho”, “uma emoção”, “algo maravilhoso” como alguns citam o que sentiram no questionário.


Escolas





Centro de Educacional Nº 01 do Cruzeiro
Diretor: Antônio José Rodrigues Neto
Quantidade de alunos: 780 aproximadamente – idade: 11 a 20 anos.
Galeria Escolar: “Vivência com Arte”- Sala de Artes.

O grupo saiu em carreata e no meio do caminho nos perdemos. Mas tudo acabou bem. Ao passo que o Sr. Paulo e o Alex retiravam as obras do carro, Aloilson, Helena e Aristos, ajudavam carregando as obras. Floriano já estava filmando para não perder nenhum detalhe do evento. Achei a escola um pouco diferente, mas tinha o mesmo nome Centro de Ensino Nº 01. Para minha surpresa aquela não era a escola, era a escola ao lado, Centro Educacional Nº 01 do Cruzeiro! Foi muito divertido! Rapidamente colocamos tudo de volta e fomos para escola agendada. Chegando lá, a TV já se encontrava lá, mas era para uma matéria sobre as condições precárias daquela instituição de ensino.
A minha ansiedade e curiosidade eram grandes, pois não sabia como os alunos haviam decorado e que nome os alunos haviam dado à “Galeria Escolar” que foi montada na Sala de Artes do Getúlio (pedi ao Getúlio para não me contar). Meu amigo Getúlio Cruz é professor de Artes e também ator de teatro e cinema, pois ele é um dos atores que está no filme “Loucos Por Cinema”. Foi ele quem fez o primeiro contato na escola para que a exposição pudesse ir até lá. Jandira, a esposa dele, se empenhou em divulgar o projeto por intermédio do Correio Braziliense (matéria do dia 29 de abril).
Fiquei encantada. A Galeria recebeu o nome “Vivência com Arte” segundo o Getúlio. Os alunos fizeram um sorteio e o nome foi dado por uma aluna. Também estava escrito “Seja Bem Vinda Mary Jô” com lindas letras em cartolina, enfeitadas com glitter e purpurina. Floriano registrando tudo, a equipe de apoio desembrulhando os quadros, todos nós trabalhando. Foi quando ouvi uma voz - as paredes não foram furadas! Só existe a marcação com os nomes das deusas. Sorte que eu havia levado furadeira, parafusos, arames, martelo, prego etc. Então recebemos a primeira turma depois do recreio.
O primeiro contato é maravilhoso, os alunos entram naquele ambiente de Galeria, já querem ir direto às obras de tão admirados que ficam, não é apenas um artista que está ali numa oficina, é uma “Galeria” com suas obras, com o artista criador daquelas obras. Eu mesma fico impressionada como a atmosfera muda, como uma obra de arte tem força e também com a capacidade da arte de tocar os corações e almas. Os alunos são muito acessíveis à arte, apenas não têm a oportunidade de manter contato com ela. Nessa escola pude contar com a força e o apoio de uma grande deusa, ou talvez todas numa só, a coordenadora de apoio, Fátima, que só falava uma palavra -Comportem-se! Senti que ela é muito querida e os alunos a respeitam muito. Posso afirmar que todos os profissionais da escola e, principalmente, os professores são grandes guerreiros, merecem todo o nosso respeito e atenção.








2ª escola










Centro de Ensino Agrourbano – CAUB
Diretora: Sheila Pereira as Silva
Quantidade de alunos:600- idade 5 a 17.
Galeria Escolar: “Acrópole”- Sala de Coordenação.


Acordamos cedo mais uma vez e seguimos para a escola. O lugar tem um cheiro de mato, muito gostoso, a escola é muito bonita, pintada em tons fortes de verde, vermelho, e, ao lado, encontra-se um pequeno posto de saúde e o correio. Gostaria de destacar a ação dos nossos bravos professores que construíram com recursos próprios a sala dos professores e a sala de coordenação que foi cedida para a Galeria. Foi surpresa também o nome e a decoração da Galeria.


Primeira imagem






Um grande movimento, de um lado, um grupinho de lindos adolescentes, meninas e meninos. As meninas que pareciam ter saído de um quadro,”Madonas” como disse Floriano, faziam artisticamente o nome da Galeria “Acrópole” e desenhavam duas grandes colunas de papel para colocarem na porta da Galeria. O professor de filosofia ensinou como escrever em grego o nome da galeria - quando vi a escrita em grego fiquei admirada, pois em nossa casa é ensinado o grego. Pude contar com o apoio dos alunos maiores que ajudaram a carregar as obras, a montar, a fixar os banners da exposição, todos muito amáveis. Nos divertimos muito, tirando muitas fotos. Fui surpreendida com turminhas enormes de crianças de 5 a 12 anos. Crianças lindas e muito educadas eram acompanhadas pelos professores que me ajudaram, pois tive que utilizar um vocabulário adequado a crianças tão pequenas, por exemplo, a palavra “Arquétipos”, cujo significado não conheciam. As deusas vieram da Grécia, país das Olimpíadas, que todos os alunos já haviam visto na TV. Então explicava que essas deusas vieram da Grécia e que são muito parecidas com mulheres aqui do Brasil. A deusa Hera virou a mulher que se preocupa com o nome da família e a tradição; Afrodite representa a vida na terra, a vida que é bela, tão bela quanto as meninas e mulheres que se amam e são vaidosas . A deusa Atena “virou a deusa sabida”. Existiam muitas meninas sabidas e meninos também, que gostavam de estudar assim como a deusa e queriam ter uma boa profissão. Algumas crianças ainda estão sendo alfabetizadas e não poderiam responder ao questionário entregue em sala de aula logo após a visita a galeria. Assim, combinamos que elas desenhariam a deusa que mais gostassem. Afrodite foi a preferida, seguida por Hera e Ártemis. A deusa Ártemis já tem uma bandeirinha erguida nessa escola. Todas as crianças diziam para não jogar lixo por causa do mosquito da dengue. Realmente muito cativante!



Planejamento




Na minha cabeça tudo estava perfeito, milimetricamente planejado do ponto à virgula. Mas... a vida nunca é bem assim! Três semanas antes, estava visitando escolas, participando de reuniões, negociando com a galeria do Senado, fazendo contatos com pessoas que me apóiam nesta primeira etapa, e comprando materiais diversos. Teve dias que precisava estar em três lugares diferentes.
Infelizmente, um projeto como esse não pode ser aplicado só com boa vontade, pois não é caridade, uma cesta básica não resolve, a fome é outra, fome de saber, de conhecer, e a grande vontade que presenciei foi a vontade de conhecer e de ter acesso à cultura. Pude perceber através dos olhares inocentes de crianças, que diante do primeiro impacto com a arte ficaram simplesmente boquiabertos, como se um novo mundo estava se descerrando em frente delas. Para mim, ficou claro que esse momento foi especial para elas e que seria uma experiência que levariam para o resto de suas vidas...
A escola está aberta à cultura, o espaço me foi cedido e os alunos também estavam abertos à experiência. Basta ler os depoimentos e ver os desenhos que exporei no Senado. Executei as obras com recursos próprios, e estou levando as obras às escolas em parte com recursos próprios, mas sozinha não conseguiria, já que são muitas as despesas.
Nesta primeira etapa pude contar com o apoio financeiro de um amigo que possibilitou recursos financeiros. Ainda assim, tudo foi válido, até os imprevistos. Sempre levo comigo amigos em carreata por conta dos imprevistos e posso considerar que tem sido uma grande ajuda. Graças aos amigos, pude contar com mão de obra para montagem e desmontagem, motorista e outros serviços necessários e não depender só da palavra. Sem eles o orçamento seria bem maior.
Esses são os pontos essenciais para a continuidade do projeto e que será aplicado nas 2ª e 3ª etapas. Por motivo de viagem, darei continuidade ao projeto em setembro. Estou interessada em qualquer iniciativa de natureza social. Apresentarei orçamentos para os interessados em participar deste projeto. Os recursos serão para atender os gastos materiais e humanos.
Os contatos poderão ser feitos através dos e-mails:
mjodeusas@gmail.com , amjorfanidis2@yahoo.com.br , já tenho dois espaços agendados, uma ONG - Fenações Integração Social e a Escola Classe n°01 da Candangolandia. Tenho consciência de que estou fazendo muito pouco, mas é o que posso fazer.










Conclusão

A força que me leva são os olhares expressivos e a sede de conhecer dos alunos. É um grande privilégio colocar a minha arte à serviço de uma sociedade ainda em formação. Confesso que por momentos pensei que não fosse conseguir, mas Deus tem enviado seus anjos para me ajudar. Ei-los: Heraldo Póvoas de Arruda, Floriano Regis de Oliveira, Maricin Rojas, Aloilson e Helena,Aristos, Patrícia, e Alexandre meu marido, que tem executado as seguintes funções: carregador, furador de paredes, empacotador, fotógrafo, segurança, e financiador. Também sou grata ao Sr. Paulo Rodrigues da LP Molduras. Para a segunda etapa já posso contar também com apoio da Comunidade Grega Ortodoxa de Brasília.



Até lá!